quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Gutenberg e Gacon na Origem da Imprensa

Jornal «A GUARDA»
"Jornal «A GUARDA» - Edição de 28-06-2007"
SECÇÃO: Opinião

A Imprensa foi inventada porque os livros, que tinham de ser laboriosamente escritos à mão, não se produziam suficientemente depressa e a baixo custo.

Os primeiros impressores sabiam que havia uma grande procura de livros, mas que as pessoas gostavam daquilo que conheciam e não se fiavam em ideias novas. Assim, descobriam formas de dar às pessoas o tipo de livro que lhes era familiar, mas em maior quantidade.

Durante muitos séculos, o único modo de produzir um livro, era escrevê-lo à mão. As limitações eram óbvias, só se conseguia fazer um número muito reduzido de livros, eram necessários muitos copistas a trabalhar ao mesmo tempo e a copiar o mesmo texto. Assim tornou-se imperativo encontrar uma forma mais rápida e mais barata para satisfazer a crescente procura de livros, o que aconteceu com o tipo móvel.

O ourives alemão Johannes Gutenberg (c.1400 – c. 1468) é apontado como o inventor do tipo móvel, isto é, um conjunto completo de letras feitas de acordo com um determinado desenho. Tal aconteceu há cerca de 560 anos, embora a impressão tenha sido inventada há mais de mil anos no Extremo Oriente, na China ou na Coreia.

Os chineses imprimiam rolos e livros usando blocos de madeira com páginas inteiras de caracteres gravados neles. A grande novidade deu-se no séc. XV, na Europa, com a invenção do tipo móvel, que era uma única letra num pequeno bloco que era montada em palavras, linhas e páginas, podendo usar-se muitas vezes.

Uma das grandes vantagens dos tipos móveis é a correcção dos erros, uma vez que o impressor substitui uma letra por outra com toda a facilidade e sem se notar e a impressão em massa de livros.

Gutenberg experimentou o seu novo invento em folhas soltas, antes de imprimir o primeiro livro. Cerca de 1455, viria a produzir a primeira Bíblia impressa do mundo. Seria conhecida como a Bíblia de Gutenberg ou das 42 Linhas, por ter esse número de linhas por página. Imprimiram-se cerca de 170 exemplares, uns em pergaminho outros em papel. Trata-se de uma obra volumosa, em dois volumes e que terá levado vários anos a compor e imprimir. Ele quis que se assemelhasse o mais possível a uma Bíblia manuscrita.

Escolheu o tipo gótico da escrita manual alemã e decorou as páginas tal como os copistas faziam (os primeiros impressores pretendiam que os seus livros se assemelhassem aos belos manuscritos que as pessoas estavam habituadas a comprar). Este livro não tem indicação de data, do lugar de impressão ou da identidade do impressor.

Trabalharam simultaneamente na obra seis prelos e consumiu-se grandes quantidades de papel e de velino. Foi fruto de uma tipografia bem apetrechada de tipos e de todos os instrumentos essenciais, o que representou despesas avultadas para a época.

Com a conclusão (possivelmente por Johann Fust e Peter Schoeffer) da Bíblia de Gutenberg ou das 42 Linhas, a utilização da nova arte passou definitivamente de Gutenberg para a nova firma, de Johann Fust e Peter Schoeffer, de onde saiu a primeira edição do famoso Saltério*, que se distingue por ser o primeiro livro impresso datado e assinado. Com esta obra a imprensa sairia, por fim, do anonimato.

A notícia do êxito de Gutenberg espalhou-se rapidamente pela Europa. Em 1465 emergem em Veneza os tipos romanos, ou latinos. Com Nicolaus Jenson e Aldus Manutius estabelece- se um novo standard da impressão. No ano de Mil e Quinhentos, havia mil e cem tipografias no Velho Continente.

No nosso país, a primeira oficina de impressão terá aparecido em Faro, em 1487, e pertencia a Samuel Gacon. A ele se deve a edição do primeiro incunábulo** português, uma impressão do Pentateuco*** em hebraico, da qual existe apenas um original na British Library em Londres.

Este editor judeu concluiu o livro em 30 de Junho de 1487e teria recorrido a caracteres metálicos móveis, quadrados e elegantes. A tipografia hebraica portuguesa teve origem em Itália, sendo trazida de lá pelos judeus. Outros incunábulos foram provavelmente impressos em Portugal antes de 1487 (seriam as chamadas Obras de D. Pedro, a Imitação de Cristo e a Cartilha de D. Diogo Ortiz), mas não se conhece o seu rasto, pelo que se aceita a referida obra como a primeira a ser impressa no nosso país.

No séc. XIX, a prensa manual, que se tinha mantido durante séculos, é ultrapassada por máquinas de produção em massa.

Na história da cultura humana não há acontecimento que tenha a importância do invento da impressão com tipos móveis. O poder da influência da palavra impressa, para bem ou para mal, manifesta-se em todas as iniciativas e experiências humanas e proporciona a libertação do espírito da humanidade, da ignorância e da superstição.

* Livro litúrgico que contém os Salmos.
** Documento impresso mediante a utilização de caracteres móveis nos primórdios da tipografia, até 1500.
*** Os Cinco Livros de Moisés. São os primeiros da Bíblia, escritos em hebreu arcaico e considerados o fundamento da História de Israel.
* Técnico Superior de Biblioteca e Documentação
Por: António José Ramos de Oliveira
Reproduzido com a devida autorização

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